30 de outubro de 2010

As Duas Mortes – Arthur de Salles no Olvido

“Duas vezes se morre. Primeiro na carne. Depois no nome”. É assim que o poeta Manuel Bandeira, no poema “Os Nomes, define os dois tipos de morte: a física e o esquecimento. Da primeira não podemos escapar, uma vez que somos também matéria que se finda. Entretanto, pessoas adquirem consistência de eternidade através de obras, mitos e registros, como o próprio Bandeira e milhares de personalidades de diversos campos: ciências, artes, política, etc. Infelizmente, no cenário baiano, um nome vem sendo cada vez mais esquecido: Arthur de Salles que, junto a Castro Alves e Gregório de Matos, completa um dos lados do mais ilustre triângulo da poesia baiana.
Ao ler seus versos, percebe-se a influência que o mar exerce em sua poética. “Ocaso no Mar” é considerado um dos mais belos poemas descritivos da língua portuguesa, rendendo comentários, inclusive, do crítico literário Agripino Grieco: “se toda a poética nacional se perdesse num naufrágio, e só restasse ‘Ocaso no mar’, o crítico literário, lendo-o, exclamaria: ‘Aqui viveu um grande povo! ‘


Ocaso no Mar
O céu a valva azul de uma concha semelha
de que outra valva é o mar ouriçado de escamas.
No ponto de junção, o sol – molusco em chamas -
do bisso espalha no ar a incendida centelha.
Listões de intenso anil, raias de cor vermelha,
grandes manchas de opala, arabescos e lhamas,
da luz todos os tons, da cor todas as gamas
vibram na valva azul que a valva verde espelha.
Mas todo este fulgor esmaece e se apaga.
Tímido, o olhar do sol bóia de vaga em vaga,
porque uma sombra investe a sua concha enorme.
É a noite: como um polvo, insidiosa, se eleva.
Desenrola os seus mil tentáculos de treva,
e o sol, vendo-a crescer, fecha as valvas e dorme



Apesar de tanta representatividade, Arthur de Salles é conhecido e valorizado apenas nos meios acadêmico e literário. Em 2002, foi homenageado no Nº 35 da Revista da Bahia-FUNCEB e um de seus poemas foi recitado por Maria Bethânia no show “Tempo tempo tempo tempo”. Atualmente, seu nome resume-se a fachada de Escola Pública em Salvador; e Praça e Biblioteca, em São Francisco do Conde. Milhares de baianos cantam o Hino ao Senhor do Bonfim sem saber que um dos autores é o poeta que nos deixou um acervo relativamente pequeno, porém de grande valia para a literatura brasileira, o que deveria ser motivo de orgulho e não de esquecimento para toda a população baiana.  E por falar em esquecimento, a Banho de Sol termina com uma música do saudoso Nelson Cavaquinho, que fala justamente desse assunto.

Professora a senhora vai fazer faaalta ..

Vaaaaai ficaaar pra sempre no coraação da gentee prooziinhaa haha'  ...
 

ARTHUR DE SALLES

LÚCIA

Lúcia chegou, quando do inverno o tredo
Vento agitava o coqueiral vetusto.
Vinha ofegante, e pálida de susto,
E trêmula de medo...
.
Ah! quanto beijo e quanto riso ledo
Deu-me o seu lábio, rúbido e venusto!
Quanto divino sentimento augusto,
Quanto infantil segredo!
.
Lúcia partiu... E aquele riso doce
Lúcia levou! A casa transformou-se
Num sepulcral degredo.
.
Se o vento agita o coqueiral vetusto,
Inda a recordo: pálida de susto
E trêmula de medo...


PÚRPURAS

Na púrpura do Verso o ouro do Sonho ardente,
Fio a fio, teci. Era manhã! Radiava
Em pleno azulo meu belo sol adolescente.
E o meu Sonho, a essa luz, resplendia e cantava.

Como a enrediça, a vida, indomada e ascendente,
Por minha mocidade em mil voltas serpeava.
E tudo, no esplendor de um mundo renascente,
Sonoro, multicor, multímodo, vibrava.

Musa, que não gemeu flébil, magoada e langue:
Vivaz, tonto de luz, salta o primeiro verso,
Ao primeiro rebate estuoso do meu sangue.

Ó selvas tropicais! Ó sonoras luxúrias!
Mundo excelso do Sonho, esvoaçando, disperso,
No incontentado ardor dessas rimas purpúreas!


SUB UMBRA

Levo o passo, hora morta, através da sombria
Soledade feral desta antiga abadia.
Fumosos lampiões nos corredores ermos
Lançam frios clarões palescentes e enfermos.
E vai comigo a noite e a cisma. Um vão lamento
Enche lá fora a treva. É o sussurro do vento
Que vem, vaga desfeita, inéxcita, rolando
E nas sombras claustrais vagamente expirando.
E no silêncio de novo, o astro silêncio. A forte
E fria sensação terebrante da morte
Desce destes glaciais lampiões morrediços,
Vem dos traços de sombra esguios, movediços
Que se alongam no chão de lápides marcado
E dançam no brancor expectante e gelado
Destas paredes ancestrais. Oh! estas riscas
De sombra, tateando estas paredes priscas!
Letras de ignota mão que traceja o problema
Do ser e do não ser, da dúvida suprema?
Geometria do nada? Eis que a sombra recua
E a parede aparece inteiramente nua.
E na sua mudez fria, rígida e calma
Fala-me: Tudo é vão, tudo é vão, menos a alma.
Menos a fé no além. Menos essa esperança
De outra vida de paz e bem-aventurança.
Menos essa beleza, a suprema beleza
Da renúncia de tudo, a heróica fortaleza
De fazer do silêncio a divina guarida.
Tudo mais, sombras vãs na parede da vida.



( Marcado, inicialmente,  pelo Simbolismo e passando, em seguida, por  uma experiência parnasiana, não cultivará a impassibilidade. Nos momentos mais felizes de sua poesia, e que não são poucos, Arthur de Salles conseguiu a perfeita consonância, entre a música do verso e o seu conteúdo )


29 de outubro de 2010

Simbolimo

 
    O HOMEM


O homem, o poeta, é o mundo consciente...
Pelos seus lábios fala a pedra, o nevoeiro
No silencio, ele oculta o que mais sente
No que é mais vago, é mais verdadeiro.

O ser humano como tudo, principia
Em insofismável matéria, que termina
Numa vontade, numa luz, em harmonia
Numa rima astral, numa emoção divina

Num sentimento infindo e misterioso
Num invisível mas sensível clarão
Como matéria transcendente, é luminoso
O poeta é alguém que forma uuma visão.
Pressago

Nas ÁGUAS daquele lago
dormita a sombra de Iago...

Um véu de luar funéreo
cobre tudo de mistério...

Há um lívido abandono
do luar no estranho sono.

Dá meia-noite na ermida,
como o último ai de uma vida.

São badaladas nevoentas,
sonolentas, sonolentas...
Do céu no estrelado luxo
passa o fantasma de um bruxo

No mar tenebroso e tetro
vaga de um náufrago o espectro.

Como fantásticos signos,
erram demônios malignos.

Na brancura das ossadas
gemem as almas penadas.

Lobisomens, feiticeiras
gargalham no luar das eiras.

Os vultos dos enforcados
uivam nos ventos irados.

Os sinos das torres frias
soluçam hipocondrias.

Luxúrias de virgens mortas
das tumbas rasgam as portas.

Andam torvos pesadelos
arrepiando os cabelos.

Coalha nos lodos abjetos
sangue roxo dos fetos.

Há rios maus, amarelos
de presságios de flagelos.

Das vesgas concupiscências
saem vis fosforescências.

Os remorsos contorcidos
mordem os ares pungidos.

A alma cobarde Judas
recebe expressões cornudas.

Negras aves de rapina
mostram a garra assassina.

Sob o céu que nos oprime
langüescem formas de crime.

Com os mais sinistros furores,
saem gemidos das flores.

Caveiras! Que horror medonho!
Parecem visões de um sonho!

A morte com Sancho Pança,
grotesca e trágica, dança.

E como um símbolo eterno,
Ritmo dos Ritmos do inferno.

No lago morto, ondulando,
dentre o luar noctivagando,





~~** Simbolismo ~~**

O Simbolismo foi uma escola literária de poetas, que tinham colegas por todo mundo como o francês Charles Baudelaire, mas tinham pouco reconhecimento e aceitação artística. Vários de seus integrantes morreram pobres, não tiveram obras publicadas e permaneceram ou permanecem esquecido até hoje.
Movimento de relações com o Modernismo, influencia a maioria dos poetas da 1ª fase do Modernismo. Aqui surgem as primeiras rupturas com os padrões rígidos de composição e restabelecimento da relação entre poesia e existência, separadas pelos parnasianos.

     Textos:

Cárcere das Almas
Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço, olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.
Tu se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo Espaço da Pureza.
Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!
Nesses silêncios solitários, graves,
Que chaveiro do Céu possui as chaves
Para abrir-vos as portas do Mistério?!

Ismália
Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-me na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra no mar.
No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...
E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria dar a lua do céu,
Queria a lua do mar...
As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu.
Seu corpo desceu ao mar...


Aluna: Larissa Rocha IIº K

Poema

Ossa Mea

II
Mãos de finada, aquelas mãos de neve, 
De tons marfíneos, de ossatura rica,
Pairando no ar, num gesto brando e leve, 
Que parece ordenar mas que suplica.

Erguem-se ao longe como se as eleve
Alguém que ante os altares sacrifica:
Mãos que consagram, mãos que partem breve, 
Mas cuja sombra nos meus olhos fica...

Mãos de esperança para as almas loucas, 
Brumosas mãos que vêm brancas, distantes, 
Fechar ao mesmo tempo tantas bocas...

Sinto-as agora, ao luar, descendo juntas, 
Grandes, magoadas, pálidas, tateantes,
Cerrando os olhos das visões defuntas...



Por: Izabele Andrade
Simbolismo



Entende-se
aqui por Simbolismo, não o conjunto de manifestações espiritualistas do último quartel do séc. XIX e o primeiro quartel do séc. XX (como têm entendido alguns), mas, num sentido mais especificamente histórico-literário, uma escola ou corrente poética (incluindo a poesia em prosa e a poesia teatral), que se afirma sobretudo entre 1890 e 1915 e que se define por um conjunto de aspectos, aliás variáveis de autor para autor, que dizem respeito às atitudes perante a vida, à concepção da arte literária, aos motivos e ao estilo. Sem dúvida esta corrente literária insere-se na atmosfera mental, antipositivista, de fins do séc. XIX; mas certos caracteres de técnica literária, de forma, são inerentes ao conceito de Simbolismo aqui adoptado. Entretanto, há ainda um conceito mais restrito: o daqueles que, tomando como pontos de referência paradigmáticos Mallarmé e Claudel, definem o Simbolismo pela busca obstinada duma verdade metafísica, demanda cujo instrumento de descoberta seria o símbolo. Com efeito, se teimássemos em definir o Simbolismo tão-só pela visão do Universo como teia de analogias, floresta de misteriosas «correspondências» (na acepção baudelairiana) que o poeta se propõe desvendar, então não teria havido Simbolismo autêntico em Portugal: os poetas portugueses dessa época ter-se-iam limitado a copiar grosseiramente gestos cujo sentido profundo não alcançavam. Mas os próprios autores considerados representantes do Simbolismo francês, de que o nosso deriva (Baudelaire, Rimbaud, Verlaine, Mallarmé, Laforgue, Régnier, A. Samain, Valéry, etc.), seguiram caminhos divergentes, a ponto de Johansen afirmar que discordavam uns dos outros em quase tudo excepto quanto à existência dum ideal em poesia e na aguda consciência do estilo


Principais autores simbolistas do Brasil :


A

  • Alphnsus de Guimaraens
  • Artur de Sales

B

  • Batista cepelos

C

  • Carlos Dias Fernandes

E

  • Eduardo Guimarães

F

  • Farias Neves Sobrinho

  • José Albano

L

  • Luis Delfino

N

  • Nestor Vitor

P

  • Pedro Kikerry

X

  • Xavier Marques

28 de outubro de 2010

Alphonsus de Guimaraens ..

Cisnes Brancos

Ó cisnes brancos, cisnes brancos,
Porque viestes, se era tão tarde?
O sol não beija mais os flancos
Da Montanha onde mora a tarde.

Ó cisnes brancos, dolorida
Minh’alma sente dores novas.
Cheguei à terra prometida:
É um deserto cheio de covas.

Voai para outras risonhas plagas,
Cisnes brancos! Sede felizes...
Deixai-me só com as minhas chagas,
E só com as minhas cicatrizes.

Venham as aves agoireiras,
De risada que esfria os ossos...
Minh’alma, cheia de caveiras,
Está branca de padre-nossos.

Queimando a carne como brasas,
Venham as tentações daninhas,
Que eu lhes porei, bem sob asas,
A alma cheia de ladainhas.

Ó cisnes brancos, cisnes brancos,
Doce afago da alva plumagem!
Minh’alma morre aos solavancos
Nesta medonha carruagem...

Quando chegaste, os violoncelos
Que andam no ar cantaram no hinos.
Estrelaram-se todos os castelos,
E até nas nuvens repicaram sinos.

Foram-se as brancas horas sem rumo,
Tanto sonhadas! Ainda, ainda
Hoje os meus pobres versos perfumo
Com os beijos santos da tua vinda.

Quando te foste, estalaram cordas
Nos violoncelos e nas harpas...
E anjos disseram: — Não mais acordas,
Lírio nascido nas escarpas!

Sinos dobraram no céu e escuto
Dobres eternos na minha ermida.
E os pobres versos ainda hoje enluto
Com os beijos santos da despedida.


A Catedral

Entre brumas ao longe surge a aurora,
O hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu risonho
Toda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma áurea seta lhe cintila em cada
Refulgente raio de luz.
A catedral ebúrnea do meu sonho,
Onde os meus olhos tão cansados ponho,
Recebe a benção de Jesus.

E o sino clama em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Por entre lírios e lilases desce
A tarde esquiva: amargurada prece
Poe-se a luz a rezar.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu tristonho
Toda branca de luar.

E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O céu e todo trevas: o vento uiva.
Do relâmpago a cabeleira ruiva
Vem acoitar o rosto meu.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Afunda-se no caos do céu medonho
Como um astro que já morreu.

E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Ismália

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava longe do céu...
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar. . .
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma, subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...

( A poesia de Alphonsus de Guimaraens é marcadamente mística e envolvida com religiosidade catolica. Seus sonetos apresentam uma estrutura clássica, e são profundamente religiosos e sensíveis na medida em que ele explora o sentido da morte, do amor impossivel , da solidão e da inaptação ao mundo. )

Cruz e Sousa ..

A borboleta Alzul  ..

No alegre sol de então
De uma manhã de amor,
A borboleta solta no fulgor
Da luz, lembrava um leve coração.
Ia e vinha e a voar
Gentil e trêfega, azul,
Sonoramente a percorrer pelo ar,
Como um silfo tenuíssimo e taful.
Sobre os frescos rosais
Pousava débil, sutil,
Doirando tudo de um risonho abril
Feito de beijos e de madrigais.
Que doce embriaguez
O vôo assim seguir
Da borboleta azul, correndo, a vir
Do espaço pela Etérea candidez!
Fazendo, tal e qual,
O mesmo giro assim,
O mesmo vôo límpido, sem fim,
Nos mundos virgens de qualquer ideal.
Ir como ela também
Em busca das loucas
E tropicais e fulgidas manhãs
Cheias de colibris e sol, além...
Ir com ela na luz
De mundos através,
Sem abrolhos nas mãos, cardos nos pés,
Ó alma, minha, que alegria a flux!...
No alegre sol de então
De uma manhã de amor
A borboleta solta no fulgor
Da luz, lembrava um leve coração.


Escárnio perfumado

Quando no enleio
De receber umas notícias tuas,
Vou-me ao correio,
Que é lá no fim da mais cruel das ruas,

Vendo tão fartas,
D'uma fartura que ninguém colige,
As mãos dos outros, de jornais e cartas
E as minhas, nuas - isso dói, me aflige...

E em tom de mofa,
Julgo que tudo me escarnece, apoda,
Ri, me apostrofa,

Pois fico só e cabisbaixo, inerme,
A noite andar-me na cabeça, em roda,
Mais humilhado que um mendigo, um verme...


Canção Negra

Ó boca em tromba retorcida
Cuspindo injúrias para o Céu,
Aberta e pútrida ferida
Em tudo pondo igual labéu.
Ó boca em chamas, boca em chamas,
Da mais sinistra e negra voz,
Que clamas, clamas, clamas, clamas,
Num cataclismo estranho, atroz.
Ó boca em chagas, boca em chagas,
Somente anátemas a rir,
De tantas pragas, tantas pragas
Em catadupas a rugir.
Ó bocas de uivos e pedradas,
Visão histérica do Mal,
Cortando como mil facadas
Dum golpe só, transcendental.
Sublime boca sem pecado,
Cuspindo embora a lama e o pus,
Tudo a deixar transfigurado,
O lodo a transformar em luz.
Boca de ventos inclemente
De universais revoluções,
Alevantando as hostes quentes,
Os sanguinários batalhões.
Abençoada a canção velha
Que os lábios teus cantam assim
Na tua face que se engelha,
Da cor de lívido marfim.
Parece a furna do Castigo
Jorrando pragas na canção,
A tua boca de mendigo,
Tão tosco como o teu bordão.
Boca fatal de torvos trenos!
Da onipotência do bom Deus,
Louvados sejam tais venenos,
Purificantes como os teus!
Tudo precisa um ferro em brasa
Para este mundo transformar...
Nos teus Anátemas põe asa
E vai no mundo praguejar!
Ó boca ideal de rudes trovas,
Do mais sangrento resplendor,
Vai reflorir todas as covas,
O facho a erguer da luz do Amor.
Nas vãs misérias deste mundo
Dos exorcismos cospe o fel...
Que as tuas pragas rasguem fundo
O coração desta Babel.
Mendigo estranho! Em toda a parte
Vai com teus gritos, com teus ais,
Como o simbólico estandarte
Das tredas convulsões mortais!
Resume todos esses travos
Que a terra fazem languescer.
Das mãos e pés arranca os cravos
Das cruzes mil de cada Ser.
A terra é mãe! -- mas ébria e louca
Tem germens bons e germens vis...
Bendita seja a negra boca
Que tão malditas coisas diz!


( Seus poemas são marcados pela musicalidade , pelo individualismo , pelo sensualismo , e as vezes pelo desespero , e tambem pela grande obcessão que ele tem pela cor branca.)

27 de outubro de 2010

Características do Simbolismo

-->musicalidade e sinestesia

"Visões, salmos e cânticos serenos,
surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...
Dormências de volúpicos venenos
sutis e suaves, mórbidos, radiantes"...

-->vocábulo litúrgico e novamente a musicalidade e a sinestesia.

"Infinitos espíritos dispersos,
Inefáveis, edênicos, aéreos,

Fecundai o mistérios destes versos
Com a chama ideal de todos os mistérios."

-->espiritualidade, mistérios, diafaneidade constantemente presente nos poemas.

"Tudo! Vivo e nervoso e quente e forte,
nos turbilhões quiméricos do Sonho,
passe, cantando, ante o perfil medonho
e o tropel cabalístico da Morte!"


*De novo a sinestesia, presença do sonho e a referência ao misticismo da Cabala.

->Características na forma:

-Não se descreve um objeto; sugere-se a existência dele.
-Emprego de letras maiúsculas no verso.
-Uso de um vocabulário bíblico, litúrgico, esotérico e arcaico no sentido de revitalizá-lo.
-Musicalidade
-A imprecisão no sentido de certos vocábulos para caracterizar o indefinível e o indizível.
- Dá-se importância às frases nominais.
-Embora tenham dado importância ao verso livre, os simbolistas ainda estavam presos a poemas bem elaborados formalmente, como os parnasianos.

->Características no conteúdo:

-Religiosidade, misticismo, espiritualismo, esoterismo.
-Expressão de estados da alma profundos e complexos.
-Sonho; não o sonho sentimental dos Românticos, mas os sonhos mais escondidos do ser humano.
-Presença do inconsciente e do subconsciente.






           Aluna -  Jéssica Campos Conceição, II K

26 de outubro de 2010

O cachimbo

O cachimbo
Uma visão do tenebroso Limbo.
Soturna e sepulcral, tens a teu lado:
Por um artista foi este cachimbo
À feição de caveira burilado.
Vê tu, formosa, é um crânio em miniatura
Onde tua caveira vou revendo:
O vazio das órbitas fulgura,
Sinistramente, quando à noite o acendo.
E às vezes, quando o eterno ideal me abrasa
O crânio, no cachimbo os olhos ponho:
Há também dentro dele fogo e brasa,
Sobe o fumo e desfaz-se como um sonho.
E quando à noite o acendo, a sua boca
Transparente e magoada se clareia:
E ri-se, e eu rio ao vê-la, aberta e louca,
Toda de beijos e de afagos cheia.
                                  Alphonsus de Guimarães

25 de outubro de 2010

Poema

                A Catedral

Entre brumas ao longe surge a aurora,
O hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu risonho
Toda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma aurea seta lhe cintila em cada
Refulgente raio de luz.
A catedral eburnea do meu sonho,
Onde os meus olhos tao cansados ponho,
Recebe a bencao de Jesus.

E o sino clama em lugebres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Por entre lirios e lilases desce
A tarde esquiva: amargurada prece
Poe-se a luz a rezar.
A catedral eburnea do meu sonho
Aparece na paz do ceu tristonho
Toda branca de luar.

E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O céu e todo trevas: o vento uiva.
Do relâmpago a cabeleira ruiva
Vem acoitar o rosto meu.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Afunda-se no caos do céu medonho
Como um astro que já morreu.

E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Poema

Triunfo Supremo
Quem anda pelas lágrirnas perdido,
Sonâmbulo dos trágicos flagelos,
É quem deixou para sempre esquecido
O mundo e os fúteis ouropéis mais belos.

É quem ficou do mundo redimido,
Expurgado dos vícios mais singelos,
E disse a tudo o adeus indefinido
E desprendeu-se dos carnais anelos!

É quem entrou por todas as batalhas
As mãos e os pés e o flanco ensangüentando,
Amortalhado em todas as mortalhas.

Quem florestas e mares foi rasgando
E entre raios, pedradas e metralhas,
Ficou gemendo mas ficou sonhando !
                                                             Cruz e Souza 


No poema se destacam a musicalidade, a fantasia, subjetivismo.


                  Por: Jadilene Mascarenhas 

24 de outubro de 2010

Ivana (beautiful teacher)

Algumas das poesias simbolistas de Cruz e Souza:

ANTÍFONA


             Ó Formas alvas, brancas, Formas claras
             De luares, de neves, de neblinas!
             Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
             Incensos dos turíbulos das aras
             Formas do Amor, constelarmante puras,
             De Virgens e de Santas vaporosas...
             Brilhos errantes, mádidas frescuras
             E dolências de lírios e de rosas ...

             Indefiníveis músicas supremas,
             Harmonias da Cor e do Perfume...
             Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,
             Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...

             Visões, salmos e cânticos serenos,
             Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...
             Dormências de volúpicos venenos
             Sutis e suaves, mórbidos, radiantes ...

             Infinitos espíritos dispersos,
             Inefáveis, edênicos, aéreos,
             Fecundai o Mistério destes versos
             Com a chama ideal de todos os mistérios.

              Do Sonho as mais azuis diafaneidades
             Que fuljam, que na Estrofe se levantem
             E as emoções, todas as castidades
             Da alma do Verso, pelos versos cantem.

             Que o pólen de ouro dos mais finos astros
             Fecunde e inflame a rima clara e ardente...
             Que brilhe a correção dos alabastros
             Sonoramente, luminosamente.

             Forças originais, essência, graça
             De carnes de mulher, delicadezas...
             Todo esse eflúvio que por ondas passa
             Do Éter nas róseas e áureas correntezas...

             Cristais diluídos de clarões alacres,
             Desejos, vibrações, ânsias, alentos
             Fulvas vitórias, triunfamentos acres,
             Os mais estranhos estremecimentos...

             Flores negras do tédio e flores vagas
             De amores vãos, tantálicos, doentios...
             Fundas vermelhidões de velhas chagas
             Em sangue, abertas, escorrendo em rios...

              Tudo! vivo e nervoso e quente e forte,
              Nos turbilhões quiméricos do Sonho,
              Passe, cantando, ante o perfil medonho
             E o tropel cabalístico da Morte...



Cárcere das Almas
Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço, olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.
Tu se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo Espaço da Pureza.
Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!
Nesses silêncios solitários, graves,
Que chaveiro do Céu possui as chaves
Para abrir-vos as portas do Mistério?!
 
  Cruz e Sousa
  Pressago
Nas ÁGUAS daquele lago
dormita a sombra de Iago...

Um véu de luar funéreo
cobre tudo de mistério...

Há um lívido abandono
do luar no estranho sono.

Dá meia-noite na ermida,
como o último ai de uma vida.

São badaladas nevoentas,
sonolentas, sonolentas...

Do céu no estrelado luxo
passa o fantasma de um bruxo

No mar tenebroso e tetro
vaga de um náufrago o espectro.

Como fantásticos signos,
erram demônios malignos.

Na brancura das ossadas
gemem as almas penadas.

Lobisomens, feiticeiras
gargalham no luar das eiras.

Os vultos dos enforcados
uivam nos ventos irados.

Os sinos das torres frias
soluçam hipocondrias.

Luxúrias de virgens mortas
das tumbas rasgam as portas.

Andam torvos pesadelos
arrepiando os cabelos.

Coalha nos lodos abjetos
sangue roxo dos fetos.

Há rios maus, amarelos
de presságios de flagelos.

Das vesgas concupiscências
saem vis fosforescências.

Os remorsos contorcidos
mordem os ares pungidos.

A alma cobarde Judas
recebe expressões cornudas.

Negras aves de rapina
mostram a garra assassina.

Sob o céu que nos oprime
langüescem formas de crime.

Com os mais sinistros furores,
saem gemidos das flores.

Caveiras! Que horror medonho!
Parecem visões de um sonho!

A morte com Sancho Pança,
grotesca e trágica, dança.

E como um símbolo eterno,
Ritmo dos Ritmos do inferno.

No lago morto, ondulando,
dentre o luar noctivagando,

corvo hediondo crocita
da sombra d’Iago maldita!
 
  Cruz e Sousa

Fragmento poético


"Ó Formas alvas, brancas, Formas claras
de luares, de neves, de neblinas!...
Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
Incenso dos turíbulos das aras..."
                                                        Cruz e Souza 
 Neste fragmento podemos ver claramente o gosto que os poetas simbolistas tinham pela cor branca.  Não só Cruz e Souza (que era criticado por ser negro e ter esse apego à cor branca), mas muitos outros poetas da mesma escola literária.
Por: Luana Karina 
Violões que Choram...
Ah! plangentes violões dormentes, mornos,
soluços ao luar, choros ao vento...
Tristes perfis, os mais vagos contornos,
bocas murmurejantes de lamento.

Noites de além, remotas, que eu recordo,
noites de solidão, noites remotas
que nos azuis das Fantasias bordo,
vou constelando de visões ignotas.

Sutis palpitações à luz da lua
anseio dos momentos mais saudosos,
quando lá choram na deserta rua
as cordas vivas dos violões chorosos.

Quando os sons dos violões vão soluçando,
quando os sons dos violões nas cordas gemem,
e vão dilacerando e deliciando,
rasgando as almas que nas sombras tremem.

Harmonias que pungem, que laceram,
dedos nervosos e ágeis que percorrem
cordas e um mundo de dolências geram,
gemidos, prantos, que no espaço morrem...

E sons soturnos, suspiradas mágoas,
mágoas amargas e melancolias,
no sussurro monótono das águas,
noturnamente, entre ramagens frias.

Vozes veladas, veludosas vozes,
volúpias dos violões, vozes veladas,
vagam nos velhos vórtices velozes
dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
                                                       Cruz e Souza 


Neste poema, destacam-se a fantasia (misticismo e espiritualismo), a musicalidade, é um tanto triste também... E eu, mais uma vez, gostei muito.


Por: Luana Karina

Poema

             A morte

Oh! Que doce tristeza e que ternura
No olhar ansioso, aflito dos que morrem...
De que âncoras profundas se socorrem
Os que penetram nessa noite escura!
Da vida aos frios véus da sepultura
Vagos momentos trêmulos decorrem...
E dos olhos as lágrimas escorrem
Como faróis da humana Desventura.
Descem então aos golfos congelados
Os que na terra vagam suspirando,
Como os velhos corações tantalizados.
Tudo negro e sinistro vai rolando
Báratro abaixo, aos ecos soluçados
Do vendaval da Morte ondeando, uivando.

                                           Cruz e Souza

Achei o poema profundo, trágico, triste, enfim... Como gosto de coisas assim resolvi postá-lo '-' E este poema foi publicado na época que Cruz e Souza já se encontrava um tanto próximo da morte, tísico, como descreve o autor do site - este é o nexo entre sua vida e esta obra.

Por: Luana Karina

Simbolismo - PEDRO KILKERRY


Vida e Obra

Nascido em Salvador, no dia 10 de Março de 1885, Pedro Kilkerry, não chegou a publicar nenhum livro durante sua vida, somente um em 1971 com seus 36 poemas e ajudou em alguns periódicos (jornais) como: Os Anais e Cruzada.

Características
As principais características da poesia de Kilkery são: uma sintaxe bastante elaborada, fantasias humorísticas, musicalidade, ou seja, ele representou outro lado do simbolismo, aquele mais radical, suas poesias eram difíceis e dependiam de concentração para serem entendidas. As obras de Kilkery foram colocadas como críticas da vanguarda.

POEMAS DE PEDRO KILKERRY


HORAS ÍGNEAS

I
Eu sorvo o haxixe do estio...
E evolve um cheiro, bestial,
Ao solo quente, como o cio
De um chacal.

Distensas, rebrilham sobre
Um verdor, flamâncias de asa...
Circula um vapor de cobre
Os montes — de cinza e brasa.

Sombras de voz hei no ouvido
— De amores ruivos, protervos —
E anda no céu, sacudido,
Um pó vibrante de nervos.

O mar faz medo... Que espanca
A redondez sensual
Da praia, como uma anca
De animal.

II
O Sol, de bárbaro, estanque,
Olho, em volúpia de cisma,
Por uma cor só do prisma,
Veleiras, as naus — de sangue...

III
Tão longe levadas, pelas
Mãos de fluido ou braços de ar!
Cinge uma flora solar
— Grandes Rainhas — as velas.

Onda por onda ébria, erguida,
As ondas — povo do mar —
Tremem, nest’hora a sangrar,
Morrem — desejos da Vida!

IV
Nem ondas de sangue... e sangue
Nem de uma nau — Morre a cisma.
Doiram-me as faces do prisma
Mulheres — flores — num mangue...